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quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

DIA DO PASTOR PRESBITERIANO - 17 DE DEZEMBRO

 (Rev. José Manoel da Conceição - 1822-1873)

A Igreja Presbiteriana do Brasil - IPB comemora o Dia do Pastor no dia 17 de dezembro, em virtude de ser essa data o dia em que foi ordenado o Primeiro Pastor Presbiteriano Brasileiro, o Rev. José Manoel da Conceição (1822-1873).
Em homenagem a esse grande Ministro Presbiteriano segue uma pequena síntese biográfica do Rev. José Manoel da Conceição.

Sobre o ministério do Rev. José Manoel da Conceição, diz o Historiador, Rev. Vicente do Rego Themudo Lessa:

“São raios de luz apenas sobre tão distinta personalidade, em todos os tempos uma forte inspiração para os que tem em vista o ministério sagrado.”[1]

Assim que J. M. da Conceição, resignadamente, afastou-se do encargo de sua paróquia em Brotas, em 28 de setembro de 1864, partiu ao encontro dos Missionários Rev. A. G. Simonton e Rev. A. L. Blackford, na Corte.
            José Manoel da conceição nasceu em 11 de março de 1822, em São Paulo. Filho do português Manoel da Costa Santos e da fluminense Candida Flora de Mascarenhas. Aos dois anos de idade foi residir junto com os pais em Sorocaba, São Paulo.[2]
            Sua educação e influência foram dadas por seu tio-avô, o Padre José Francisco de Mendonça, seu padrinho de batismo – que ocorreu em 24 de março de 1822 na Sé de São Paulo.[3] Com a morte da mãe, quando ele ainda era pequeno, o pai casou-se novamente com Maria do Amaral de quem lhe nasceram três meninos e uma menina.[4]
Aos doze anos passou a frequentar a Classe do Padre Jacinto Heliodoro de Vasconcelos. Nessa “escola” aprendeu as primeiras letras: aritmética, geometria, gramática, história sagrada e catecismo. Depois estudou latim com o Padre José Gonçalves, tudo em Sorocaba. E aos 18 anos inicia a leitura da Bíblia.
Decidido ser Padre, ao fim dos estudos do latim, foi para São Paulo para se preparar no Curso Anexo da Academia Jurídica, pois não havia seminário. As aulas de Teologia eram ministradas por Professores na própria residência dos Mestres e depois na Sé.
            O primeiro contato que ele teve com os protestantes foi quando percebeu que os imigrantes de Sorocaba (ingleses e alemães) liam a Bíblia e outros livros relacionados a ela. Pensou então:

“Quem sabe se os estrangeiros tem tanta religião como nós brasileiros? Queria saber se a religião deles é a mesma que a nossa religião. Ah! Quem sabe se eles são mais religiosos do que nós, visto que são também mais civilizados do que nós.”[5]

Ele tinha 20 anos quando isso aconteceu. Essa impressão ele teve quando frequentava a Fábrica de Ferro do Ipanema, em Sorocaba, quando ia visitar ali a família Godwin e via aos domingos a devoção dessa família e muitos outras.
            Em 30 de abril de 1842 foi tonsurado[6] e recebeu as ordens menores da Igreja Católica e a de subdiácono.
            O contexto político nessa época estava bem aquecido pela Revolução Liberal, ele e o tio-avô apoiaram essa revolução o que retardou a sua ordenação.
            Sobre a Revolução Liberal, diz Fernando Kitzinger Dannemann:

“A revolução liberal de 1842, ela aconteceu quando o imperador D. Pedro II dissolveu a Assembleia Geral que ainda se encontrava trabalhando em suas sessões preparatórias, alegando que as irregularidades e fraudes cometidas no processo de eleição é que haviam determinado a vitória dos liberais. Estes não se conformaram com a decisão imperial e iniciaram, então, nas províncias de São Paulo e Minas Gerais, a uma série de pronunciamentos indignados contra a dissolução efetivada. Logo em seguida uma delegação do Partido Liberal saiu de São Paulo com destino ao Rio de Janeiro, pensando em encontrar-se com o imperador para discutir a questão, mas não foi recebida por ele. A recusa provocou o surgimento de um movimento rebelde na cidade paulista de Sorocaba - cuja câmara aprovou por aclamação o nome do brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar como presidente da província -, agitação que se estendeu às cidades de Taubaté, Pindamonhangaba, Silveiras e Lorena. Uma coluna formada por 1.500 homens – a Coluna Libertadora - marchou então sobre a capital paulistana, mas foi enfrentada por tropas legais comandadas por Caxias. No combate que aconteceu em Vargem Grande, hoje Vargem Grande do Sul, os revolucionários não tiveram melhor alternativa senão recuar e retornar a Sorocaba, onde acabaram se dispersando. Com o fracasso do movimento o brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar fugiu para o sul do país, enquanto em Sorocaba o padre Feijó, que estava comprometido com os rebeldes, foi preso e exilado para o Espírito Santo.”[7]

Jose Manoel da Conceição e seu tio-avô foram intimados a depor no inquérito que se formou contra o Regente Feijó. Mas em nada foram prejudicados.[8]
O Padre J. M. da Conceição foi ordenado Diácono em 29 de setembro de 1844, com 22 anos de idade e depois ordenado Presbítero em 29 de junho de 1845, aos 23 anos de idade. Foi Pároco em Água Choca (Monte Mor), Piracicaba, Santa Bárbara, Taubaté, Sorocaba, Limeira, Ubatuba e por último Brotas, todas as cidades da província paulista. Em todos esses lugares ele sempre foi estimado. Vivia sendo transferido de uma paróquia para outra, pelo Bispo Dom Manoel Joaquim Gonçalves de Andrade, pois sua postura de sacerdote católico era mais semelhante a de um Ministro protestante. E como era estimado pelo Bispo, este o transferia constantemente para não prejudicar Conceição.
            Como era muito amigo dos protestantes era chamado Bispo da região de o “Padre Protestante”.
            Em 05 de setembro de 1852, morreu seu pai, Manoel da Costa Santos. Teve o Padre J. M. da Conceição que cuidar dos 4 irmãos, filhos do segundo casamento de seu pai e que provavelmente a mãe dessas crianças havia morrido. Os que ficaram mais próximos dele foram Gertrudes de Amaral Cerqueira Leite (apelidada de Tudica) – que mais tarde se casaria com José Rufino de Cerqueira Leite – e Venceslau da Costa Santos, Presbítero e casado com Adelaide, filha de Remígio de Cerqueira Leite, irmãos de Antônio Pedro de Cerqueira Leite.
            Quanto mais ele lia, estudava e mantinha contato com os protestantes, novas conclusões ele foi tendo a respeito da vida cristã.
            A partir daí o coração do Padre J. M. da Conceição já estava inclinado à fé reformada. Ele mesmo aponta os Reverendos A. G. Simonton, e A. L. Blackford e a esposa deste, Elizabeth, como o: “... objeto da minha gratidão, são inseparáveis da minha conversão e entrada na família cristã...” e ainda. “... eis os dignos instrumentos de que quis Deus servir-se para me fazer cristão” [9].
            Ele estava convencido que o evangelho romano não era o evangelho de Jesus Cristo.
            Já envolvido pelo evangelho marcou uma reunião com Dom Sebastião Pinto do Rego, Bispo Diocesano e assim renunciou o encargo da Paróquia de Brotas. Em seguida foi encontrar-se com os amigos protestantes os pastores Rev. A. G. Simonton e o Rev. A. L. Blackford e não tardou para que, em 23 de outubro de 1864, fizesse a sua pública profissão de fé e fosse batizado[10] pelas mãos do Rev. A. L. Blackford, na Igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro.
            A mensagem de salvação ardeu em seu coração e passou, não só a ser membro da Igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro, mas fez uso dos seus dons e talentos para atuar na redação do jornal Imprensa Evangélica.
            Entretanto suas aspirações eram mais elevadas. Era seu intento anunciar o evangelho de Cristo, como verdadeiro ministro de Deus que era.
            Logo após a organização do primeiro Presbitério, em 16 de dezembro de 1865, o Presbitério do Rio de Janeiro, o ex-Padre, depois de um exame referente aos conhecimentos bíblicos, foi ordenado o primeiro Ministro Presbiteriano Brasileiro, em 17 de dezembro de 1865, pela imposição das mãos dos ministros do Presbitério, Rev. A. G. Simonton, Rev. A. L. Blackford e Rev. F. J. C. Schneider. Os três após a oração de ordenação disseram: “Dou-vos a mão direita em sinal de que acabais de ser admitido a tomar parte conosco neste ministério” [11]. Tinha ele 44 anos de idade.
            As tentativas de retorno do ex-Padre para o seio da Igreja Católica Apostólica Romana, pelos seus amigos, foram incansáveis. Mas eles não lograram êxito nessa investida. Sua sentença de excomunhão e desautorização foi publicada no Correio Paulistano, em 23 de abril de 1867.
            Cumpridas as formalidades da Igreja Católica, as perseguições logo se iniciaram. Em maio de 1867, o Rev. J. M. da Conceição publicava: “Sentença de excomunhão e resposta”.[12] Um documento de 32 páginas. Publicou em três capítulos: “A minha defesa”, “A fé primitiva exposta” e “O que devia fazer”.
            Seu ministério não foi longo, 8 anos apenas, mas os frutos do seu trabalho duram até os dias de hoje. Cabe aqui esse destaque sobre esse grande homem de Deus, que foi o Rev. José Manoel da Conceição.
            O primeiro biógrafo do ex-Padre foi o Coronel Augusto Fausto de Souza, que publicou nos meses de janeiro e fevereiro de 1884 nos suplementos do jornal Imprensa Evangélica sob o título “O Reverendo Evangélico José Manoel da Conceição”[13] a história desse ministro de Deus. Depois seria vez do Historiador Rev. Vicente do Rego Themudo Lessa[14] e do Rev. Boanerges Ribeiro[15] e alguns outros que fizeram menção ao seu ministério em publicações e artigos em jornais.
            Diz o Coronel Fausto:

“Dispondo dos mais brilhantes dotes para preenchera sua sagrada missão: presença nobre e atraente, voz harmoniosa, acionado correto e em perfeita relação com o discurso, e eloquência arrebatadora, o rev. Conceição percorreu as três províncias (Rio, S. Paulo e Minas), de uma a outra extremidade, reunindo, como os apóstolos, ao poder da palavra, os exemplos de mansidão, amor ao trabalho, zelo ardente pela fé, pureza em todas as ações, afabilidade para com todos, e extraordinária resignação nos lances dolorosos que o afligiam no corpo e no espírito. Chegando a um sitio, se resolvia a ter aí alguma permanência, procurava alguma choça ou algum telheiro que lhe servisse de abrigo, às vezes mesmo edificado por suas mãos e coberto de ramos; se, porém, sua demora era passageira, ele pedia hospedagem em qualquer casa, preferindo as de modesta aparência; e, antes de sair dela, procurava dar um sinal do seu reconhecimento, servindo de enfermeiro a algum doente, consolando tristezas ou mesmo prestando serviços humildes, como varrer, lavar, etc.”[16]

Esse fato narrado pelo Coronel Fausto é apenas um dos muitos que ele registrou. As roupas que ganhava, as distribuía a uma pessoa mais necessitada do que ele.
            Seus relatórios pastorais ao Presbitério do Rio de Janeiro atestam o seu espírito missionário e desbravador. Em seu primeiro relatório ele registra que saiu de São Paulo no dia 23 de fevereiro de 1866 e iniciou a evangelização, visitando casa por casa, passando por Cotia, Una, Piedade, Sorocaba, São Roque, Porto Feliz, Piracicaba, Capivari, Rio Claro, Brotas, Limeira, Campinas, Belém de Jundiaí (Itatiba), Bragança, Atibaia, Juqueri, São Paulo, Penha, São Miguel, Jacareí, São José dos Campos, Caçapava, Taubaté, Pindamonhangaba, Aparecida, Guaratinguetá, Lorena, Queluz, todas essas Cidades na Província de São Paulo; continuou sua missão, já na Província do Rio de Janeiro foi para Resende, Barra Mansa e Piraí, onde embarcou na Estrada de Ferro rumo a Corte, chegando em 29 de junho de 1866.[17] Muitos lugares ele não deve ter registrado, mas é possível que outros lugares receberam a sua visita. Em julho de 1866 ele apresentava o seu primeiro relatório ao Presbitério do Rio de Janeiro.
Essas viagens ele fazia a pé. Isso mesmo. Sem levar nenhum recurso. Apenas uma mala e uma Bíblia.
Em Julho de 1867, continuou na sua missão, mas a saúde já não lhe era muito boa.
            Nova investida ele fez, saindo do Rio de Janeiro foi para São Paulo, Sorocaba, Itú, São Roque, Porto Feliz, Piracicaba, Limeira, Rio Claro, Campinas, Amparo, Bragança, Cotia, Uma, Piedade, Capivari, Atibaia, São Miguel, São José, Santa Isabel, Santo Antônio da Cachoeira (Piracicaba), Nazaré, Belém de Jundiaí (Itatiba), Santo Amaro, Itapecerica, Pindamonhangaba, Itaquerí, Brotas e Jaú. E continuou dessa vez indo para a Província de Minas Gerais. Primeiro em Borda da Mata, em março de 1867, Pouso Alegre, Santana do Sapucaí e Ouro Fino e outros que o seu segundo relatório – do período de junho de 1866 a julho de 1867 - deixou de registrar, como ele mesmo registrou comunicando ao Presbitério. Nesse relatório ele registrou que seu estado de saúde não estava bom, e seu trabalho talvez não tivesse a mesma intensidade quando de antes, mas que faria tudo o que Deus permitisse.
            No mês de julho de 1867, na Corte, esteve pregando em Copacabana, São Cristóvão, Cascadura, Maxambomba (Nova Iguaçu), Macacos e Serra, bairros junto às estações de trem da Estrada de Ferro Dom Pedro II - somente em 1861 é que são inaugurados os serviços regulares de transporte de passageiros. O nome das estações se dava em virtude da própria construção e os nomes dos bairros.[18]
            O jovem Antonio Pedro de Cerqueira Leite, em viagem a região norte de São Paulo registrou:

“O nome do padre José Manoel esta espalhado pelo universo, não há um lugar onde se passe, que não falem em seu nome”.[19]

Essas são as verdadeiras marcas de Cristo deixadas por aqueles que cumprem o IDE de Jesus e levam o evangelho das boas novas.
            Adoentado, precisando de tratamento adequado, foi para os EUA, embarcando no Rio de Janeiro em 03 de agosto de 1867 e aportando em Nova York, em 12 de setembro de 1867.
            Ao chegar, apresentou-se ao Rev. David Irving (Secretário da Junta de Missões) e encontrou-se com o Rev. G. W. Chamberlain – que nessa ocasião encontrava-se nos EUA angariando recursos para construção do Templo da Igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro.
            Nos EUA visitou as Igrejas Presbiterianas Portuguesas de Springfield e Jacksonville, em Illinois. Visitou, também, dois irmãos do Rev. A. G. Simonton.
            Seu espírito evangelizador o levou a pregar nas duas Igrejas citadas acima. Aproveitou para conhecer as cidades de Chicago, Syracusa e Nova York. Depois retornou ao Brasil, embarcando em 23 de junho de 1868 e chegando ao Rio de Janeiro em 20 de julho de 1868. Nos EUA nem se preocupou em tratar da saúde, queria pregar o evangelho e trabalhar na causa de Cristo, ocasião em que colaborou na revisão de uma tradução do Novo Testamento, que a Sociedade Bíblica Americana estava realizando a partir do grego e do siríaco. E também, na tradução de folhetos e artigos para a Sociedade Americana de Tratados.
Em 01 de agosto desse mesmo ano foi para São Paulo acompanhado dos pastores Rev. A. L. Blackford e o Rev. F. J. C. Schneider e de lá visitou Cotia, São Roque, Sorocaba, Campo Largo, Alambari e Itapetininga, retornando para São Paulo e daí para o Rio de Janeiro, mas dessa vez de navio e em companhia do Rev. G. W. Chamberlain. Visitaram Angra dos Reis e Parati e depois subiram a serra em direção a Cunha e de lá para Lorena, onde aconteceu um episódio que mais a frente registraremos.
            Sua vida foi um eterno evangelizar. Quem nos dias de hoje investiria nessa grande empreitada?
            Depois de Lorena retornou para São Paulo, Guaratinguetá, Pindamonhangaba, Tatuapé, Caçapava, São José, Jacareí, Freguesia da Escada, Santa Isabel, São Miguel, Arujá e São Paulo novamente. Nem chegou a descansar e retomar as forças, partiu para Atibaia, Bragança, Freguesia das Antas, São José dos Campos, Amparo e Socorro. O Rev. J. M. da Conceição era uma pessoa tão simpática e carismática e por onde passava fazia amigos e era admirado por estes, inclusive pelos Padres que muitas das vezes o hospedavam e liam o jornal Imprensa Evangélica, como foi o caso do Padre José, em Mogi Mirim e do Padre João Soares.
            No seu relatório, datado de 16 de agosto de 1869,[20] percebemos a alteração da sua caligrafia, tremula... mas demonstrando muito amor e dedicação por Cristo e pela evangelização. Esse foi o último relatório a ser apresentado por ele. Sua ênfase agora estava voltada para a consolidação dos trabalhos já existentes e não mais a de um “Bandeirante Presbiteriano”. Esse relatório é bem longo possui 07 paginas. No qual ele registra nomes de pessoas que os Pastores e Missionários deveriam procurar caso fossem visitar essas cidades. Também registra nomes de pessoas que desejavam ouvir mais do evangelho. Parece que esse relatório não foi recebido com muito interesse, como aponta o Historiador Rev. Alderi Souza de Matos.[21]
            Continuou na senda da evangelização... Sozinho... A estrutura eclesiástica e as formalidades não o atraiam. Queria evangelizar!
As perseguições aos protestantes eram certas, até as autoridades as chefiavam. O número de pregadores era pequeno. E com o Rev. J. M. da Conceição não foi diferente. Em Campanha, em 1880, foi apedrejado. Em outro lugar foi perseguido por um fazendeiro e seus escravos com chicotes, cassetetes e cães que o deixaram gravemente ferido lançado na estrada. Muitas das vezes a investida desses homens eram frustradas, como num caso em Pindamonhangaba que o malfeitor iria atacá-lo, mas a mensagem pregada foi mais forte e o homem não concretizou o seu intento, pelo contrário abrigou o Rev. J. M. da Conceição. Em Minas Gerais, outro caso, um homem de posse de um cassetete não o molestou, pois a Palavra de Deus o atingiu.[22]
Assim, eram tratados os protestantes no Brasil. Mas, mesmo com todos esses obstáculos, a Igreja Presbiteriana continuou sua missão.
O Rev. J. M. da Conceição era um homem culto, conhecedor de matemática, ciências físicas e naturais, bem versado na língua portuguesa, francês, latim alemão e inglês. A Casa Laemert editou uma tradução sua do alemão para o português: “História Sagrada”, em 1856.
Privado de recursos, pois não desejava possuí-los, seus amigos por diversas vezes insistiam em lhe prover recursos e quando os dava, ele investia para ganhar almas para Cristo. Ousamos dizer que foi um “São Francisco de Assis Protestante”. Tudo que fazia era por amor ao próximo.
Muito doente, pois constantemente tinha crises de depressão, era motivo de preocupação por parte de seus amigos, mas não esmoreceu. Era um homem abnegado.
Fez, ainda, algumas viagens: em 1870, esteve em São Paulo; em 1872 esteve no Rio de Janeiro, Queluz, Caldas, Campanha e outras cidades de Minas Gerais, esteve em Areias e Mambucaba; em 1873, voltou a Queluz, São Paulo, Rio de Janeiro, Piraí, Campo Belo e Caraguatatuba e outras cidades.
Quando o Presbitério do Rio de Janeiro se reuniu em agosto de 1873, foi decidido que o Rev. J. M. da Conceição deveria fixar residência no Rio de Janeiro para cuidar de sua saúde. Seu amigo, o Rev. A. L. Blackford preparou uma residência em Santa Teresa, Rio de Janeiro, uma casa aprazível e confortável para ele ficar quando retornasse.
Decidido, o Rev. J. M. da Conceição foi para a estação de trem... mas foi surpreendido... já era tarde da noite e a estação estava fechada. Maltrapilho... descalço... foi preso desumanamente. Três dias depois foi solto após escrever para um amigo do Rio de Janeiro. Não pode viajar. Estava sem recursos. Resolveu ir a pé. Doente... faminto... sem forças... não aguentou... desmaiou próximo a Estrada da Pavuna  (antiga Av. Automóvel Clube e atualmente Av. Pastor Martin Lutter King, onde corre a Linha 2 do Mêtro). Era dia 24 de dezembro de 1873. As autoridades passando e vendo aquele moribundo levaram-no para a Enfermaria do Quartel do Exército em Campinho. [23] O Diretor era o Coronel Augusto Fausto de Souza que prestou todo o cuidado necessário. O Rev. J. M. da Conceição bem fatigado só respondia por monossílabos e mexia com a cabeça. Depois passou a dizer que queria ficar a sós com Deus. Já era noite de Natal, 25 de dezembro de 1873. O Enfermeiro de plantão verificou o seu passamento. Dormiu no Senhor com 52 anos de idade incompletos.
O Coronel Fausto, nessa época Major, juntamente com o Subdelegado Honório Gurgel do Amaral – que foi Prefeito do Distrito Federal, Rio de Janeiro de 23 de maio de 1899 e 01 de fevereiro de 1900 - deram-lhe um sepultamento digno, mesmo que como indigente, pois até então não sabiam de quem se tratava. O corpo seria sepultado no Cemitério de Irajá, como o foi. No momento do sepultamento apareceu o irmão Candido Joaquim de Mesquita, membro da Igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro e que mais tarde seria ordenado Presbítero. Candido foi enviado pelo Rev. A. L. Blackford para encontrar o Rev. J. M. da Conceição. A Providência possibilitou esse encontro. Foi o único representante da Igreja Presbiteriana no ato fúnebre.
Quando se tornou sabido de quem se tratava, a Igreja Católica Romana na pessoa do Bispo Dom Pedro Maria de Lacerda enfureceu-se, pois os Cemitérios, apesar de serem públicos eram administrados pela Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro e benzidos pela Igreja Católica e só poderiam ser sepultados católicos em plena comunhão. Os responsáveis pelo sepultamento foram ameaçados de excomunhão. Passados nem os cinco anos previstos para a exumação, em três anos o corpo do Rev. J. M. da Conceição foi exumado e os ossos encaminhados a Igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro.
A vida do Rev. J. M. da Conceição foi um eterno servir. Compôs ainda alguns hinos que constam nos hinários Cânticos Sagrados e Salmos e Hinos: “Oh! Se me fora possível”, “Amar-te, Jesus e crer-te”, “Escreve tu com própria mão” e “Dou de mão á vaidade”. Escreveu um texto: “O Brasil necessita da pregação do evangelho?” [24] e “As exéquias de Abraão Lincoln, presidente dos Estados Unidos, 1865”. Deixou muitos artigos, cartas e sermões que foram publicados.
Seu nome nunca foi esquecido pela Igreja Presbiteriana do Brasil. Em 1928 foi criado o Instituto José Manoel da Conceição, pelo Rev. William Alfred Waddell, em Jandira, São Paulo, hoje funcionando no Seminário Presbiteriano em Campo Belo, São Paulo. Também foi homenageado com o nome de uma avenida e um busto, onde está localizada a Igreja Presbiteriana de Votorantim, São Paulo.

Diác. Nelson de Paula Pereira
Diretor do Museu da Catedral Presbiteriana do Rio de Janeiro
Coordenador do Centro de Documentção - CENDOC
nelsondepaula@catedralrio.org.br


[1] LESSA, Vicente Themudo. Padre José Manoel da Conceição. São Paulo: Est. Gráfico Cruzeiro do Sul, 1935, p. 11.
[2] CONCEIÇÃO, José Manoel da. Sentença de excomunhão e desautoração fulminada contra o ex-Padre José Manoel da Conceição, atualmente ministro da Igreja Evangélica e a resposta do mesmo. Rio de Janeiro: Tipografia Perseverança, 1867, p. 03.
[3] A palavra Sé é uma abreviatura de Sedes Episcopalis (Sé episcopal), uma estrutura de poder da Igreja Católica e costuma estar associada à principal igreja de uma região ou sua catedral.
[4] RIBEIRO, Boanerges. José Manoel da Conceição e a reforma evangélica. São Paulo: 1995, p. 09.
[5] LESSA, 1935, p. 14.
[6] A tonsura é uma cerimônia religiosa em que o bispo dá um corte no cabelo do ordinando ao conferir-lhe o primeiro grau de Ordem no clero, chamado também de "prima tonsura".
[7] DANNEMANN, Fernando Kitzinger. 1842 – Revolução Liberal (São Paulo). Publicado em http://www.fernandodannemann.recantodasletras.com.br/visualizar.php?idt=732048 Acesso em 29.04.2011. às 13h02min.
[8] RIBEIRO, 1995, p. 421.
[9] LESSA, 1935, p. 21.
[10] RIBEIRO, 1995, p. 44.
[11] ibid., 1995, p. 55.
[12] CONCEIÇÃO, José Manoel da. Sentença de excomunhão e resposta. Rio de Janeiro: Tipografia Perseverança, 1867.
[13] Jornal Imprensa Evangélica, janeiro e fevereiro, 1884.
[14] LESSA, 1935.
[15] RIBEIRO, Boanerges. O Padre Protestante. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1979.
[16] Citado por LESSA, Vicente Themudo. Padre José Manoel da Conceição. São Paulo: Est. Gráfico Cruzeiro do Sul, 1935, p. 41 e 42.
[17] IPRJ. Pasta Relatórios Pastorais - Centro de Documentação – CENDOC da Igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro.
[18] PEREIRA, Nelson de Paula. As modificações do aspecto da cidade do Rio de Janeiro geradas pelas reformas realizadas por Pereira Passos a partir da Rua do Sacramento no período de 1902 a 1906. Monografia apresentada a Universidade Gama Filho – UGF, Rio de Janeiro, em junho de 2005, para obtenção do grau de Bacharel em História.
[19] LESSA, 1935, p. 54.
[20] IPRJ. Pasta Relatórios Pastorais - Centro de Documentação – CENDOC da Igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro.
[21] MATOS, 2004, p. 303.
[22] LESSA, 1935, p. 64 a 66.
[23] O Forte de Nossa Senhora da Glória do Campinho, hoje mais conhecido como “Antigo Forte do Campinho”, localizado à Avenida Ernani Cardoso, bairro do Campinho, Zona Norte do Rio de Janeiro, corre risco de desaparecer. O imóvel foi recentemente adquirido da União por particulares que agora pretendem a sua demolição. Segundo Annibal Barreto (1958), o forte foi erguido a partir de 1822 e armado com nove peças de artilharia, localizado em posição dominante no desfiladeiro de Irajá. Era apoiado por outras baterias complementares situadas nas elevações fronteiras, sendo a mais importante das fortificações que protegiam a antiga Estrada Real de Santa Cruz. Existe ainda a hipótese dessa posição ter sido fortificada desde 1710, atuando no combate às forças invasoras do francês Jean-François Duclerc. Desarmado a partir de 1831, em 1852 passa a abrigar o Laboratório Pirotécnico do Exército, uma fábrica de munições que teria funcionado até 1900. Em 1958, servia de Quartel para o Regimento Moto-Mecanizado e para o Núcleo da Companhia de Comunicações da Divisão Blindada. De 1972 a 2005 ali esteve instalado o 15º Regimento de Cavalaria Mecanizada. Desde então, o local ficou sem uso e o Exército iniciou o processo de leilão do imóvel, adquirido por uma empresa de São Paulo. Disponível em: <http://www.fortalezasmultimidia.com.br/novidades/index.php?list_ano=2007&list_mes=07> Acesso em 28.04.2011.
[24] Uma cópia do original desse texto encontra-se no Centro de Documentação – CENDOC.